26.1.19

Brasil, a última cruzada

A série "Brasil, a última cruzada" é um documentário com seis episódios
no qual se revisa a história antiga do Brasil.

18.1.19

Letramento, o VILÃO da alfabetização no Brasil

No Brasil, sobra letramento, mas ler e compreender textos bem é raridade. Conheça um dos graves problemas educacionais que impede nossas crianças de aprender a ler com eficácia.

15.1.19

Vale a pena ler todo e qualquer livro?

Nenhum professor pode aprender no lugar do aluno; apenas o aluno pode aprender por si mesmo. O que um bom professor pode fazer é expor a verdade e o passo-a-passo para se chegar até ela, na ordem correta, possibilitando ao estudante segui-lo pari passu rumo à verdade, que o aluno então vislumbra com a luz de sua própria inteligência.

É isso o que uma boa história faz, por meio de experiências individuais concretas nas quais o leitor participa vicariamente (ou seja, colocando-se no lugar dos personagens), e não por meio de proposições universalmente verdadeiras que conduzem a uma conclusão. Porém, é fundamental perceber que, em uma boa história, as experiências individuais são materializações, ou encarnações, da verdade universal.

Em uma boa história, o modo pelo qual o autor representa os objetos leva o leitor a contemplá-los de maneira verdadeiramente iluminadora. O artista tem uma vantagem sobre a natureza: ele pode trazer à tona e evidenciar o que, na natureza das coisas, está no íntimo e escondido; ele pode fazer com que as coisas pareçam o que são. A heroína da história pode ser bela e boa, e o herói pode ser corajoso e belo. Sua aparência exterior combina com seu caráter interior. Evidentemente, isso não nos transmite um conhecimento, mas uma apreciação correta, um senso correto. Isto segue a ordem natural da formação da nossa mente e do nosso caráter. A inclinação precede o hábito, e a descoberta precede o juízo. As boas histórias dão ao leitor a experiência e lhe mostram, de modo personificado, o que é a virtude e como ela se apresenta. Nossa experiência e compreensão da realidade se ampliam, se enriquecem e se orientam. 

Em alguma medida, todas as artes fazem isso. Uma pintura, por exemplo, é uma representação de um aspecto da realidade, tal qual o é uma história. O que o pintor faz por nós é mostrar-nos um aspecto particular do objeto, ou compartilhar conosco uma percepção que ele teve sobre o objeto representado. Ele nos permite ver o objeto como ele, artista, o vê - que, muitas vezes, em uma pintura excelente, é uma maneira pela qual nós não veríamos sem o seu auxílio. Assim se amplia a experiência de quem vê; não apenas pela apresentação de objetos que de outro modo não seria possível ver - digamos, de algo que exista do outro lado do mundo -, mas também graças a um certo modo de apresentação que, de outro modo, permaneceria desconhecido de quem vê. Quando olho para uma tela de Thomas Moran, por exemplo, deleito-me com a imagem, ao mesmo tempo em que aprendo algo sobre a importância da luz e sombra para uma apreciação mais completa da natureza. Posso universalizar essa lição e aplicá-la em outros campos.

Mas o que é uma boa história?

Muito tempo atrás, Aristóteles definiu o que vem a ser uma boa história. Ele afirma que é uma imitação da ação e da vida (Poética, 1450a16), e uma imitação do agente da ação em função daquela ação (ibid. 1450b4).

O contador de histórias não é um historiador

Ele também observa que o contador de histórias não é um historiador. Seu trabalho é mais nobre, porque mais filosófico e mais universal: ele ensina a verdade universal. Isso requer que a verdade seja apresentada como um todo; a história como unidade, com um começo, meio e fim, deve ser apresentada de maneira intacta.

Ora, o historiador distingue-se do poeta [o contador de histórias] por falar daquilo que de fato aconteceu, enquanto o poeta fala de espécies de coisas que poderiam acontecer. Neste sentido, a poesia é mais filosófica e mais grave do que a História, pois a poesia fala do que é universalmente verdade [ainda que aquilo de que fale possa ter de fato ocorrido em determinadas circunstâncias concretas], enquanto a História fala apenas de acontecimentos particulares que de fato ocorreram (Poética, 1451b1-10).

A História é particular; a literatura é universal. G. K. Chesterton diz isso de outra forma: um bom poeta, ou contador de histórias, tem a capacidade de proporcionar aos seus leitores "um glorioso vislumbre das possibilidades da existência" (Autobiografia). Mas essas possibilidades têm de ser possibilidades, isto é, devem ser consistentes com a realidade. "Se você desenhar uma girafa, deverá desenhá-la com o pescoço comprido. Se, na sua ousada criatividade, você se considera livre para desenhá-la com o pescoço curto, então a verdade é que você não é livre para desenhar uma girafa" (Ortodoxia).

As histórias e a ordem moral

As verdades universais que interessam ao contador de histórias relacionam-se, acima de tudo, com a ordem moral. Uma vez que as histórias abordam ações humanas, e ações humanas são boas ou más, as histórias deverão retratar as ações dos personagens nesse contexto.

No livro "A landscape with dragons" [Uma paisagem com dragões], Michael O'Brien afirma: "O sol pode ser verde, e os peixes voar pelos ares; não importa o quão fantástico seja o mundo imaginado, nele se mantém a fidelidade à ordem moral do nosso próprio universo." As histórias que lemos para nossas crianças devem refletir a ordem moral real, porque é isto que elas ensinam, à sua maneira de ensinar.

Alguns podem alegar que os maus levam a melhor neste mundo, ou que todos nós somos uma mistura de bem e mal, e uma boa história deveria levar isso em conta. É verdade, mas uma história - que não é um relato histórico - deve espelhar a realidade última, e não a passageira e acidental inversão da ordem moral. As pessoas podem até ser uma mistura de bem e mal, mas os maus devem ser vistos como algo ruim - o que, em uma história, significa que as consequências das más ações têm de ser apresentadas de maneira inteligível.

O que uma boa história pode fazer por seu filho?

A filosofia começa com a experiência comum  e com uma reflexão sobre essa experiência. As histórias fornecem as experiências certas, experiências moralmente ordenadas, para que se possa refletir com proveito. É isto que a boa leitura de uma boa história pode fazer por você: expandir sua experiência, de forma segura; mostrar, em personagens e ações concretos e particulares, como são afinal os princípios universais em sua existência na vida real, e preparar a mente e o coração para o encontro com esses mesmos princípios em sua forma universal. Isso mobiliza a mente e o coração do leitor em direção à verdade.

Eis o fundamento filosófico, por assim dizer: as histórias são naturais para o homem porque a natureza humana é composta. Composto de corpo e alma, o homem participa tanto do mundo material quanto do mundo espiritual. Seu conhecimento intelectual emerge das sensações e continua a depender delas. Todo aprendizado depende da experiência sensível. O homem precisa aprender o que conhece, ou ordenar o que conhece - pouco a pouco, conhecendo as coisas em uma espécie de confusão a princípio, e só então conhecendo-as distintamente.

As coisas mais difíceis de conhecer - coisas mais distantes do imediatamente sensível - devem frequentemente ser apreendidas por uma semelhança, antes que possam ser apreendidas em si mesmas. [O uso frequente de parábolas por Nosso Senhor ilustra essa necessidade.] Algumas coisas, é claro, podem ser apreendias tão logo as primeiras imagens, ou as primeiras formas, se apresentem. É possível entender, já num primeiro encontro com o ser, que o todo é maior que as partes, por exemplo, ou que algo não pode ser e não ser no mesmo sentido e ao mesmo tempo. Mas uma compreensão da justiça e da beleza, do certo e do errado, do sacrifício e da ambição, dependerá do que o aluno encontrar em seu ambiente, incluindo o que ele lê.

O jovem precisa ter a experiência dessas qualidades imateriais para que possa entendê-las. Algumas dessas experiências virão no dia-a-dia, mas a leitura de boas histórias pode somar-se a elas. E, como eu disse anteriormente, as boas histórias ajudam o leitor a ver de uma maneira guiada, uma vez que a história na verdade põe em relevo aqueles conceitos importantes de modo a dirigir a atenção do leitor para eles.

Trecho da conferência de Laura Berquist para o Institute for Catholic Liberal Education, de julho de 2006, sob o título "Reading literature to reveal reality". Traduzido pela equipe do blog Como Educar Seus Filhos. Original aqui.

12.1.19

As Artes do Belo

As Artes do Belo são fundamentais para a formação da personalidade e da civilização, assim também suas perversões são a base para sua destruição. Acrescente-se que tais perversões não raro, especialmente a partir do século XX, se acompanham de doutrinas que as querem justificar, e ter-se-á uma das razões do atual estado de coisas no mundo. Para agravar o quadro, ademais, temos que até filósofos tomistas acabam por contribuir para essa situação dramática ao aderir à doutrina segundo a qual as Artes do Belo não têm por fim último senão fazer obras belas. Mas também a joalheria ou a costura podem produzir obras belas, e nem por isso se dizem Artes do Belo, além de que negar que o fim último destas artes seja fazer propender ao bom e ao verdadeiro é negar o dito pelos maiores filósofos de todos os tempos e pelos mesmos maiores artistas de todos os tempos.

6.1.19

O valor do tempo

Se observarmos atentamente a vida de muitos cristãos, acharemos que eles não parecem estar no mundo para mais nada senão para não fazerem coisa alguma, ou, ao menos, coisas de proveito. Todas as horas do dia e da noite são gastas em atender ao corpo, à sua pessoa, à sua comodidade e bem-estar, sem as empregarem nalguma ocupação útil, sem terem um ideal digno e elevado, sem trabalharem nem pouco nem muito por Deus, pela sua alma, nem pelo bem do próximo. A cama, a mesa, o jogo, a conversa, o passeio, o café, o teatro, as excursões recreativas... Eis aqui o único campo que estes personagens inúteis cultivam; eis aqui os ídolos a quem eles prestam culto. Estão inteiramente dominados pelo vício da ociosidade; levam uma vida só de gozo e moleza; de cristãos não têm senão o nome.

Sem chegar ao extremo destes, há outra classe de pessoas, principalmente entre as senhoras e moças de certa classe, que passam por boas porque "não fazem mal a ninguém"; que praticam, em pequeno grau, a piedade; que ouvem a missa nos dias de festa (geralmente a que se celebra a hora adiantada, porque costumam levantar-se muito pouco tempo antes dessa hora); que rezam algumas orações que sabem de cor, ao levantar e ao deitar, e poucas mais durante o dia; que pertencem, talvez, a alguma confraria piedosa, a cujos exercícios de regra assistem raras vezes e para passar o tempo; que se confessam e comungam de vez em quando; que acodem a ouvir alguns sermões, se o pregador tem fama e é do seu agrado, ou a alguma grande solenidade religiosa, onde se possam mostrar piedosas e, ao mesmo tempo, satisfazer em parte, o seu desejo de exibição; mas afora isto (que, afinal, é tudo muito superficial) não fazem mais.

Adotar uma vida de piedade sóbria e regrada; abraçar aquelas práticas ascéticas que exigem alguma mortificação ou vencimento de si mesmo; privar-se dos seus gostos, dos seus caprichos, dos seus divertimentos favoritos, das imodéstias e das modas, dos espetáculos profanos, sempre frívolos, frequentemente perigosos, às vezes abertamente imorais; dedicar-se a algum trabalho sério, em que empregar o tempo proveitosamente; impor-se algum sacrifício a favor do próximo; tomar parte nalguma obra de caridade ou de zelo, como, por exemplo, visitar os pobres, ajudar na catequese, atender a alguma outra necessidade espiritual ou temporal da sua paróquia, etc., tudo isto é completamente alheio ao plano de vida que levam as pessoas de que vimos falando.

Entre o espelho, o passeio, as visitas, alguns entretenimentos levianos, a leitura de romances, a assistência a espetáculos, entre essas, digo, e outras frivolidades semelhantes, empregam as horas do dia, as de todos os dias, e assim passam as semanas, os meses e os anos, como se vê, numa completa ociosidade; porque esta não consiste só em não fazer nada, mas também em fazer coisas inúteis ou pueris, que não trazem benefício nenhum nem a si nem aos demais, como são todos os passatempos que acabamos de enumerar e outros deste teor.

Finalmente, entre as pessoas verdadeiramente virtuosas, pode dar-se também, e tem-se dado (se bem que muitíssimo menos acentuado, menos grosseira e mais sutil), certa espécie de ociosidade; pois tal é a índole deste vício, que como filho da preguiça, ataca em menor ou maior grau todos os homens, mesmo os mais espirituais, sendo poucos os que não sintam alguma vez a sua influência perniciosa.

E assim, são efeitos desta ociosidade ou preguiça espiritual, essa inapetência, esse tédio que de vez em quando experimentam estas almas no cumprimento de suas próprias obrigações, ou no exercício das práticas de piedade, e que faz com que omitam ou que encurtem ou que vão deixando para depois, ou que executem com frouxidão e negligência o trabalho, a meditação, a recitação do Ofício Divino, o exame particular, a leitura espiritual, as obras de caridade ou de zelo, etc., ocupando-se, entretanto, de outras coisas que são mais do seu agrado, ou em recreação mais do seu agrado, ou em leitura espiritual, as obras de caridade ou de zelo, etc., espirituais, sendo poucas que são excessivamente prolongadas, ou em conversas e visitas inúteis, ou talvez em divagações da imaginação e do espírito, pensando em coisas quiméricas e inoportunas, e comprazendo-se em fazer castelos no ar, em vez de se aplicarem em coisas de mais próxima realização e em cumprirem com fiel exatidão o plano de vida que costumam ter estabelecido para o devido emprego do tempo.

Examina-te, querido leitor, e vê em que grau e proporção pagas tributa à ociosidade para que resolvas fazer um esforço generoso para a combater e evitar, se queres agradar ao Senhor e adiantar no caminho da perfeição; pois é um dos vícios que mais retardam o progresso na vida espiritual. "Se entre todas as graças - escreve padre Faber - a maior é a perseverança, porque é a que dá às outras um valor durável, a preguiça ou a ociosidade espiritual é, pelo contrário, entre todos os vícios que atacam a vida espiritual, o mais pernicioso, porque é a antítese da perseverança" (O Progresso da Vida Espiritual, cap. XIV).

Certamente, santidade e ociosidade são duas coisas incompatíveis. Se os Santos chegaram ao grau de perfeição que admiramos neles, foi porque nunca estiveram ociosos. Santo Afonso Maria de Ligório fez o voto de não desperdiçar um momento de tempo.

A nós não se nos pede tanto, nem seria prudente que sem uma inspiração muito particular do alto e o conselho de um diretor experimentado, fizéssemos um voto semelhante; mas o que nos exige Nosso Senhor é que evitemos a ociosidade, não demos motivo para que possam dizer a nós como aos obreiros da parábola da vinha: "Como estais aqui ociosos todo dia?" (Mt XX, 6).

Que grande perda e que cegueira tão deplorável inutilizar em bagatelas o tempo que Deus nos concede para negociarmos com Ele a nossa salvação e irmos acrescentando o cabedal dos nossos merecimentos, aos quais há de corresponder depois o grau de glória de que gozaremos no Céu! E que linguagem tão insensata a daquelas pessoas que, deixando deslizar sua vida na ociosidade, se expressam nestes ou em termos semelhantes: "Vamos a tal ou tal divertimento, a fazer esta ou aquela visita, a ver tal ou tal espetáculo... Para evitar o aborrecimento e passar o tempo." São Bernardo não suportava esta expressão. "Oh! - exclamava o Santo - para passar o tempo que a misericórdia do Criador te concedeu benignamente para fazeres penitência, para obteres o perdão dos teus pecados, para adquirires a graça, para mereceres a glória!"

A perda de tempo é um grande mal e um mal irreparável. O tempo que deixamos correr na ociosidade, já não voltará mais. Podemos empregar proveitosamente o tempo restante, único de que dispomos, e o tempo vindouro, que o Senhor digne conceber-nos; e faremos bem nisso, sem dúvida, para compensarmos de alguma maneira a nossa preguiça e inação passadas; mas fazer que volte o tempo passado, para o empregarmos melhor, isso já é um impossível.

Pensa nisso, amadíssimo leitor, e pensa além disso, nos graves perigos que traz consigo a perda de tempo, quer dizer, a ociosidade. As Sagradas Escrituras assinalam esta como fonte e mãe de muitos pecados, resumindo a gravidade deste vício nestas palavras do Eclesiástico: "Muitas são as maldades que a ociosidade ensinou" (Ecl XXXIII, 29). Os mesmos Livros Santos chamam estultíssimo ao homem que se entrega ao ócio (Prov XII, 11). E o profeta Ezequiel enumera a ociosidade dos habitantes de Sodoma entre as causas principais da sua depravação e iniquidade (Ez XVI, 49). 

São Bernardo chama à ociosidade "mãe das frivolidades, madrasta das virtudes, sentina de todas as tentações e maus pensamentos", e acrescenta que "a luxúria aflige mais e seduz mais o homem quando está ocioso" (De modo bene vivendi, Serm 51). Santo Agostinho, depois de evocar a triste queda de três personagens do antigo testamento: Davi, Salomão e Sansão, diz a propósito disto: "Enquanto estiveram entregues às suas ocupações mantiveram-se santos; mas na ociosidade pereceram" (Ad. Frat. in erem., Serm. 17). "Sempre se viu - escreve um escritor ascético - correr claro e cristalino o arroio pelo declive de uma colina; mas, parando na planície, torna-se limoso; e, mais tarde, agitando-se as suas águas, que encontra nela? Inúmeros répteis: Reptilia quorum non est numerus. Eis aqui o coração do homem que dorme na inércia e na ociosidade" (Meditações Sacerdotais, Pe. Chaignon).

Alma devota que lês isto, evita a ociosidade com todo o empenho e diligência (não a confundas com o divertimento moderado e honesto); e ainda que em ti não se ache muito acentuada essa ociosidade e não te julgues em ocasião próxima de te veres induzido por ela às graves desordens que acabamos de apontar, tem presente que, se não aproveitas bem o tempo, se és mais ou menos preguiçosa e negligente no cumprimento dos teus deveres, nas práticas de piedade ou de zelo, que a tua situação e circunstâncias te permitam realizar, não adiantarás na virtude, estarás sempre estacionada e envolta nos mesmos defeitos, e não corresponderás aos desígnios de Deus, que te quer mais trabalhadora, mais diligente no seu serviço, mais perfeita, mais santa. E no fim da vida te encontrarás muito vazia de merecimentos.

Resolve-te, pois, a empregar bem o tempo que o Senhor te oferece para te santificares cada dia mais e mais; crescer em graça, em virtude, em méritos e depois na glória por toda a eternidade.

Se perguntássemos aos bem-aventurados do céu, que estão agora a desfrutar do Sumo Bem, quanto lhes custou ganhar essa coroa imortal de glória e de felicidade, responder-nos-iam que a tinham conquistado por baixo preço com um curto espaço de tempo, com alguns poucos anos empregados santamente aqui nesta vida. Isto fez dizer a São Bernardino de Sena que, num certo sentido, o tempo é o céu, visto que com ele se pode comprar o céu; mais ainda, que o tempo vale tanto como Deus, já que empregar bem o tempo equivale a permutá-lo com a posse eterna de Deus (Serm. 18).

Procuremos, caríssimo leitor, seguir nisto, como em tudo, os ensinamentos e os exemplos dos Santos, inimigos declarados da ociosidade. Interrogada, um dia, Santa Joana Francisca de Chantal, por que não queria descansar nenhum momento e por que era tão avara do tempo, respondeu: "Porque já não é meu: consagrei-o ao Senhor, e não posso tirar dele nenhum só instante, sem que cometa uma injustiça contra Aquele a quem pertence". E São Francisco de Sales, aquele varão apostólico, que tão bem soube empregar os dias todos de sua vida, fecundíssima certamente, em obras de caridade e de zelo pela glória divina e pela salvação das almas, costumava dizer com a mais profunda humildade: "Quando reflito sobre o emprego que fiz do tempo de Deus, temo que não me queira dar a sua eternidade, reservada somente aos que fazem bom uso dele".

"Tempo de Deus!" Diz o santo. Verdadeiramente, é de Deus e não nosso, porque Ele é que no-lo concede na sua amorosa providência para que o consagremos inteiramente a Ele e o empreguemos no seu divino serviço. Ditosos nós, se assim o fizermos! Que paz interior teríamos durante a nossa vida; que esperança tão doce e consoladora na hora da nossa morte; que galardão tão grande por toda a eternidade!

(A perfeição cristã, segundo o espírito de São Francisco de Sales)

Publicado originalmente aqui.
 renata massa